Cinco pras oito da manhã

pela manhã uma cena estranha acontecendo na esquina da farmácia com a biblioteca. uma moça, de uniforme, cabelo preso e óculos escuros, abraçada a um homem alto, de camiseta preta, segurando uma pochete. o abraço, logo reparei de longe, não era nada carinhoso ou amistoso. parecia doer, machucava, mas continuava. eles iam até a esquina ameaçavam descer e retornavam. eu atravessei a rua e estava pra passar ao lado deles. ela relutava ao abraço, que parecia ser obrigado. ele a encostava na parede da loja que ainda não estava aberta e falava algo bem baixinho. fiquei olhando, pois não era uma coisa que você finge que não vê, que não está acontecendo. ela reparou que eu vi. o homem alto, que com certeza escondia um olhar diabólico, não me viu ou fingiu que não me viu. eu parei. a moça percebeu. ele a empurrava para esquina, ela tentava sair das garras dele. não conseguia. ela me olhou, eu levantei os braços em sinal de "o quê eu posso fazer por você?" e ela apenas abanou a mão, ansiosamente, sinalizando um grande 'não, nada, deixe quieto'. eu segui. olhei pra trás, eles já tinham virado a esquina. minhas pernas ficaram bambas, minhas mãos tremendo e eu não sabia o que pensar. um sentimento de impotência me invadiu, mas o que eu poderia fazer para ajudar a pobre moça? minha mãe me veio a cabeça falando pra eu não me intrometer nessas situações, pois não dá pra saber onde estamos enfiando nossa garganta. fiquei com medo, medo dos homens agressivos, medo das mulheres submissas, medo da impunidade da justiça, medo dos olhos cegos que passeiam mas se negam a enxergar, medo da falta de ajuda, medo do sentimento de impotência que por certos momentos invade os corações humanos, medo de ter medo e virar as costas e seguir a vida.

 

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