o telefone tocou a uma e meia da madrugada. do outro lado da linha uma voz ofegante, quase que suada. disse que acordou por causa de um pesadelo. uma casa cheia, até o chefe estava presente. muita bebida, som alto, músicas misturadas, pessoas conhecidas. a árvore que enfeitava o salão central tinha pegado fogo. um guindaste a levou e um menino, com tênis colorido, se agarrou ao transporte e os pés começaram a pegar fogo. tensão! quatro moças em cima do caminhão do lixo, motorista em alta velocidade, colidindo com os demais. tensão! o moço de barba cerrada, sentado, na mesa redonda, com os amigos deixou a moça da saia vermelha sozinha. mulheres e mulheres iam atrás do rapaz, tímido, porém encantador. ela não sabia o que fazer. não queria dar bandeira, não queria mostrar que o observava, não queria demonstrar que não aprovava as conversas. ficou quieta, com o coração apertado. a figura do pai aparecia sem sentido, como um garçom, um porteiro ou, simplesmente, como um convidado da festa.
ao telefone, depois de contar o episódio noturno que a acordou, deixou o corpo suado, o coração disparado, a voz do outro lado da linha tentava acalmar e fazê-la dormir.
"tome uma água, ligue a TV, não pense, vá dormir, dorme com deus."
a ligação era indispensável, mas a moça da saia vermelha não sabia como aquietar o corpo e a mente. a janela de seu quarto dava para os fundos de um terreno abandonado. tensão!
estava suada, dormindo apenas com uma peça íntima e um lençol. se sentiu aliviada ao saber que era apenas um sonho ruim, pois era real demais e por momentos acreditou que tudo aquilo estava realmente acontecendo. ela tinha receio de fechar os olhos novamente e toda a cena voltar, toda a angústia também. mas precisava dormir, no outro dia cedo tinha compromissos inadiáveis. a voz ao telefone a ajudou a sentir-se bem e acordou na manhã seguinte agradecendo por ter atendido a ligação e por escutar seus clamores naquele dia tão cinza quanto os galhos da árvore queimada no salão.






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